(O Diabo original e a cópia)
Não sei se o problema é meu, mas ando chocado pela fraca qualidade dos filmes que tenho visto ultimamente e que são geralmente considerados bons filmes. Na semana passada foram logo três: primeiro o "Palais Royal", que achei um filme com um humor francês ordinário e que se transforma numa homenagem à princesa Diana, personagem que a mim não me fascina; foi depois o "Little Miss Sunshine", um filme disfarçado de indie mas para mim totalmente mainstream, com todos os condimentos para ser um sucesso comercial, tantos condimentos que o tornam irritante;
E ontem à noite foi "O Diabo Veste Prada". Uma americanada superficial, reciclada, aborrecida, moralista e utópica. Até os diálogos, que poderiam ser o ponto forte do filme, são medíocres. A quantidade de clichés que o filme tem é assustadora. Vejamos os principais:
- o vender da alma ao Diabo para arranjar emprego: o filme é sobre uma rapariga desinteressante, com um namorado igualmente desinteressante, rapariga essa que se torna de repente "fashion victim", alegadamente não por se deslumbrar com o mundo da moda, onde acabava de entrar, mas só porque queria ter depois uma carreira de respeito como jornalista, que lhe estaria garantida após um ano naquele trabalho com o Diabo;
- os bons e os maus: a rapariga é muito boazinha (percebe-se que a autora do livro que serviu de base ao filme encarna aquela personagem) e ela e o namorado têm uma amiga negra e um amigo gay, para que fiquemos logo a perceber que aquela é a "boa gente". Os do mundo da moda são uns stressados, superficiais, carreiristas e manipuladores;
- o arquétipo do chefe que faz da nossa vida um inferno: Meryl Streep faz um personagem que é suposto caracterizar Anna Wintour, editora da Vogue, uma pessoa com poder mas sem coração e impiedosa mas também insegura, que é capaz de tudo pela carreira e que vive no filme o seu quarto divórcio porque, claro, não tem tempo para a família. Razões tem a senhora para querer processar o filme;
- o final hollywoodesco: esta espécie de gata borralheira tem uma oportunidade de uma carreira de sucesso, mas no fim renuncia a toda uma vida pela qual "milhões de raparigas eram capazes de matar" porque o preço a pagar ía contra os seus princípios morais. É patético ver ela no final a voltar para o namorado e a desfazer-se da roupa de marca e passar a vestir-se como antigamente, supostamente sem gosto, como se fosse possível alguém mudar de gosto assim com o estalar de um dedo.
Um apontamento sociológico interessante é que se sai do filme com a impressão de que quem gosta dele são as pessoas que mais se interessam por moda, precisamente aquelas que o filme é suposto criticar (em suma, as pessoas que usam Prada). Ou seja, não questionaram nada sobre si próprias e esta é provavelmente a prova maior de que são efectivamente seres superficiais.
Ao menos haja alguma coisa interessante.
| cinema |
12.11.06
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6 comentários:
então o filme não faz justiça à Vogue?? raios!
é impressão minha ou a meryl streep parece a Cruella/Glenn Close dos 101 Dálmatas? será coincidência?
Gostei bastante da estreia deste crítico de cinema. O Diabo Vai ao Cinema!
Só me faltou saber como estava vestido o crítico durante a sessão e, já agora, como estavam vestidos os outros espectadores.
tanto parece a cruella, que eu saí de lá a dizer que a meryl streep foi quem fez de cruella.
eu estava de zara, como os bons e os outros espectadores estavam de prada, como os maus.
Pensava que o filme era um documentário sobre o Ratzinger!
desconhecia que a zara vendia Helmut Lang, Gola e Diesel
eu achei as roupas fantasticas, estava tao deslumbrado que nem prestei atencao a historia do filme.
Não percas brevemente: o diabo veste bershka! ;)
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